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27/02/2017
Brasil 247 - 26 de Fevereiro de 2017
Tereza Cruvinel
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O Brasil já teve ministros das Relações Exteriores com filiação partidária, tais como Afonso Arinos
ou Oswaldo Aranha, para ficar em dois exemplos notáveis. O que nunca aconteceu, seja no Império ou na República, foi a captura do Itamaraty por um partido político, com o rebaixamento do cargo de chanceler e da própria política externa à condição de mercadoria no jogo de barganhas fisiológicas, como faz Temer ao tornar a pasta um feudo do PSDB.
"A nossa política externa será regida pelos valores do Estado e da nação, não de um governo e jamais de um partido", afirmou o senador José Serra em maio passado, ao tomar posse. Temer ainda era interino, e o ministro também, mas certos de que o golpe seria vitorioso no Senado, faziam afirmações categóricas como esta, que precisou de apenas oito meses para ser desmentida pela prática. Agora, com a saída de Serra, Temer já garantiu ao PSDB que a pasta continuará sendo ocupada por um tucano, e avalia os nomes dos senadores Aloysio Nunes Ferreira e Antonio Anastasia para o cargo. Pelas posições que ocupam no partido e no programa do governo golpista – Nunes Ferreira é líder do Governo no Senado e Anastasia foi relator do impeachment e é uma espécie de arqueiro-mor do senador Aécio Neves – a política externa, agora sim, vai se transformando em expressão dos valores de um partido, ao contrário do que disse Serra. E isso num cenário internacional particularmente complexo, com a ascensão de Trump e seu nacionalismo protecionista e xenófobo, com o Brexit inglês e as incertezas que pairam sobre a União Europeia. Neste cenário, que contrariou os planos de Serra de implantar uma política externa revisionista em relação ao período anterior, que valorizou o multilateralismo e as relações Sul-Sul, o Brasil não pode mais ficar “à deriva”, como lamenta o comandante do Exército, sem um projeto nacional claro e estável. Uma política de Estado, não de um governo, não de um partido.
A diplomacia brasileira, que sempre se pautou como carreira de Estado, encarregada de executar uma política de Estado, longe das vicissitudes do jogo político menor, assiste perplexa a este rebaixamento da valorosa Casa de Rio Branco.
Para não recuar muito além da Revolução de 1930, dali para cá muitos políticos ocuparam a chefia do Itamaraty, alternando-se com embaixadores de carreira. Getúlio Vargas teve ministros como Oswaldo Aranha, do PTB, e João Neves da Fontoura, do PSD. Juscelino teve Negrão de Lima, do PSD, e Jânio teve Affonso Arinos, da UDN. A ditadura privilegiou os diplomatas de carreira mas, por curto prazo, entregou o Itamaraty a Magalhães Pinto e a Juracy Magalhães, então filiados à Arena. Na Nova República, o primeiro chanceler com filiação partidária foi Fernando Henrique, que ao se tornar presidente, privilegiou nomes da carreira, assim como fizeram Lula (que teve Celso Amorim na pasta por oito anos) e Dilma. Embora em número inferior ao de diplomatas de carreira, chanceleres com filiação partidária sempre existiram. O que nunca houve foi a entrega do Itamaraty como prêmio, ou butim de golpe, a um partido político, como faz Temer agora.
TEREZA CRUVINEL. Colunista do 247, Tereza Cruvinel é uma das mais respeitadas jornalistas políticas do País
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27/02/2017
O Itamaraty na bacia do fisiologismo
Brasil 247 - 26 de Fevereiro de 2017
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Tereza Cruvinel
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ou Oswaldo Aranha, para ficar em dois exemplos notáveis. O que nunca aconteceu, seja no Império ou na República, foi a captura do Itamaraty por um partido político, com o rebaixamento do cargo de chanceler e da própria política externa à condição de mercadoria no jogo de barganhas fisiológicas, como faz Temer ao tornar a pasta um feudo do PSDB.
"A nossa política externa será regida pelos valores do Estado e da nação, não de um governo e jamais de um partido", afirmou o senador José Serra em maio passado, ao tomar posse. Temer ainda era interino, e o ministro também, mas certos de que o golpe seria vitorioso no Senado, faziam afirmações categóricas como esta, que precisou de apenas oito meses para ser desmentida pela prática. Agora, com a saída de Serra, Temer já garantiu ao PSDB que a pasta continuará sendo ocupada por um tucano, e avalia os nomes dos senadores Aloysio Nunes Ferreira e Antonio Anastasia para o cargo. Pelas posições que ocupam no partido e no programa do governo golpista – Nunes Ferreira é líder do Governo no Senado e Anastasia foi relator do impeachment e é uma espécie de arqueiro-mor do senador Aécio Neves – a política externa, agora sim, vai se transformando em expressão dos valores de um partido, ao contrário do que disse Serra. E isso num cenário internacional particularmente complexo, com a ascensão de Trump e seu nacionalismo protecionista e xenófobo, com o Brexit inglês e as incertezas que pairam sobre a União Europeia. Neste cenário, que contrariou os planos de Serra de implantar uma política externa revisionista em relação ao período anterior, que valorizou o multilateralismo e as relações Sul-Sul, o Brasil não pode mais ficar “à deriva”, como lamenta o comandante do Exército, sem um projeto nacional claro e estável. Uma política de Estado, não de um governo, não de um partido.
A diplomacia brasileira, que sempre se pautou como carreira de Estado, encarregada de executar uma política de Estado, longe das vicissitudes do jogo político menor, assiste perplexa a este rebaixamento da valorosa Casa de Rio Branco.
Para não recuar muito além da Revolução de 1930, dali para cá muitos políticos ocuparam a chefia do Itamaraty, alternando-se com embaixadores de carreira. Getúlio Vargas teve ministros como Oswaldo Aranha, do PTB, e João Neves da Fontoura, do PSD. Juscelino teve Negrão de Lima, do PSD, e Jânio teve Affonso Arinos, da UDN. A ditadura privilegiou os diplomatas de carreira mas, por curto prazo, entregou o Itamaraty a Magalhães Pinto e a Juracy Magalhães, então filiados à Arena. Na Nova República, o primeiro chanceler com filiação partidária foi Fernando Henrique, que ao se tornar presidente, privilegiou nomes da carreira, assim como fizeram Lula (que teve Celso Amorim na pasta por oito anos) e Dilma. Embora em número inferior ao de diplomatas de carreira, chanceleres com filiação partidária sempre existiram. O que nunca houve foi a entrega do Itamaraty como prêmio, ou butim de golpe, a um partido político, como faz Temer agora.
TEREZA CRUVINEL. Colunista do 247, Tereza Cruvinel é uma das mais respeitadas jornalistas políticas do País
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